quinta-feira, 24 de julho de 2008

Test-Drive

Era a primeira viagem juntos - 10 dias em Paris. Completavam 3 meses de namoro e ficaram em um apartamentinho charmoso no Marais.

Foi uma espécie de workshop de como seria morarem juntos, assunto que ele estava pensando em propor mas precisava desse test-drive. Ele é um semi-novo (33 anos, com um casamento no curriculo) e ela 0 km.

Claro que Paris é Paris, e uma viagem com essa não dá para comparar com o dia a dia da rotina de um casal. Mesmo assim, haviam alguns pontos que puderam ser analisados. Sim, era um teste mesmo.

Se ela é bagunceira, como deixa o banheiro, se reclama das manias dele, os hábitos ao acordar e dormir, como lida com as divergências de opinião sobre "a casa", controle remoto, café da manhã... Isso seria fácil de testar em 10 dias. Muitas das situações foram provocadas por ele propositalmente.

Relatório:

- Ela escova os dentes e os cabelos antes de dormir. Ia para cama linda e cheirosa!

- Acordava mais linda e cheirosa, toda descabelada, com um sorriso no rosto, como se tivesse sonhado a noite inteira.

- Tomava banho sempre de manhã para se "des-descabelar" como ela dizia. Banho quente.

- Deixava o banheiro arrumadinho mas pendurava a calcinha lavada no box para secar. Como ele ainda está na fase de admirar as calcinhas dela, não reclamava. Pelo contrário. Quando não tomavam banho juntos, gostava de ficar olhando aquela gracinha ali pendurada.

- Organizava um café da manhã meio self-service. Ela fazia o café fresquinho e o resto era cada um por si. Gostava de pão com manteiga e café com leite. Simples. Ele já tinha as frescuras de granola, fruta, iogurte... Não conseguiram evitar as baguettes e croissants nesses dias.

- Preparava a lista do supermercado antes de sair de casa. Somente itens básicos. Na prática, colocava várias guloseimas no carrinho e ele argumentava a necessidade daquilo tudo. Fazia isso de propósito só para ela convencê-lo com um jeitinho irresistível. Outras vezes ignorava os comentários dele e dava de ombros mesmo.

- Deixava sempre ele escolher o que queria fazer durante o dia mas sempre dava uma sugestão irrecusável para complementar o programa. Apesar de ser a primeira vez em Paris, ele havia estudado tudo na internet e nos guias. Ele já estava na quarta vez na Cidade-Luz.

- Excelente navegadora, mesmo a pé. Espalhava milhos imaginários pelo caminho, como João e Maria, e não se perdia nunca. Tinha os pontos de referência, por onde já haviam passado. Ele aprendeu a ouvir e deixar ela guiá-lo.

- Depois de 3 noites morrendo de frio apesar dela ter insistido para ele levar o casaco, ele cedeu. Ela tinha razão.

- Não perturbava para entrar em lojas. No máximo olhava de rabo de olho as vitrines, memorizava o nome da rua e pedia 1 hora no fim do dia para dar a sua voltinha enquanto ele descansava. E ainda trazia um presentinho para ele.

- Conseguia convencê-lo a ligar dia sim, dia não para casa e saber notícias do pai que tinha sofrido uma cirurgia dias antes da viagem. Se dependesse dele, tinha até esquecido do assunto.

Ele ficava cada vez mais encantado e sentia que não havia nenhum esforço dela em fazer as coisas só para agradá-lo. Era natural. A essência dela era agradar, sendo prática mas com carinho.

Ela era muito parecida com a sua mãe no modo operandus do dia a dia. E ele não sabia se era isso que ele gostava nela ou se era um indicador de que não ia funcionar. Mas uma coisa era fato: ela não tinha nenhuma das características da primeira dona. Ponto positivo.

Achou então que já era hora sim de colocar um pouco de luz, cor e som naquele apartamento com paredes ainda sem quadros, de vasos sem flores e porta-retratos sem vida.

No caminho para o aeroporto, ainda em Paris, ele pediu a ela que aquelas malas saissem do Galeão e fossem direto para a casa dele. Como ela nunca sabia se ele estava brincando ou falando sério, levou um susto, mas serena como sempre, ela perguntou:

"Você quer uma mulher para viver sua vida com você, ou uma mulher para cuidar da sua vida e de você?"

Ele não soube responder. Engasgou e nada saiu. Aquele silêncio foi a resposta.

Do Galeão, um taxi seguiu para o Leblon e o outro para Laranjeiras.

4 comentários:

Tiago Moralles disse...

Pior é que esta fase realmente acontece, "Como ele ainda está na fase de admirar as calcinhas dela".

Renatinha disse...

Porque os homens NUNCA conseguem responder perguntas simples?
ódio!!!!!!!
beijos
Re

Anônimo disse...

Please !!?????
Escreve logo a segundo capitulo.
Eles dois são muito especiais, e com certeza vão retomar as perguntas e respostas..

Parabens...vc esta se mostrando uma excelente escritora....Com muito realismo e teus contos muito verdadeiros, quase que como um relato.
Me lembra aquele escritor, que vc me recomendou, o Khaled Hosseini..
Uma novela com tanta riquesa de verdade que parece um relato.
Bj

Isabella Zappa disse...

Muito boa a história! merece uma continuação!
excelente pergunta dela pra ele!! E muito corajosa!
ADorei o blog!
visite o nacordabamba!
bjs