O dia seguinte amanhece um pouco nublado e resolvo ir do Espelho até Caraívas caminhando. 1o km pelas praias com uma trilha pela falésia no caminho. 2:30. Totalmente viável. Mas o gerente da pousada não recomendou que eu fosse sozinha.
Surgem duas paulistas prestes a sair com o mesmo objetivo. Me convidei para ir junto e pé na tábua! As duas andavam bem rápido apesar de serem gordinhas. Uma hora depois estávamos perdidas. Tinha passado a entrada da trilha e chagamos numa falésia que não dava para atravessar. Meia volta, volver!
Encontramos a placa que indicava a subida. Hesitei em continuar. Disse que ia desistir e voltar para o Espelho. As gordinhas me desafiaram. Agora era uma questão de orgulho! Não podia deixar por menos.
Ainda na subida da trilha já tinha me arrependido. Meus pés, descalços, ardiam. As havaianas atrapalhavam mais do que qualquer coisa. Chego no fim da trilha preocupada. Ainda faltava pelo menos 1:30 e não sentia meu pés.
Sugeri que a dupla fosse na frente, no ritmo delas, mas que de vez em quando olhassem para trás para ver se eu estava viva. Imprimi um passo tartaruga naquela imensidão de areia, mar e céu azul. As nuvens sumiram e o sol ardia, não mais do que a sola do meu pé.
A essa altura, as havaianas melhoravam um pouco a situação. Areia fina, areia grossa, areia quente, areia fofa, areia que não acabava mais. Uma esfoliação extrema!
Me arrastando cheguei na Barraca do Satu, que na teoria ficava a 40 minutos do destino final. Paramos para uma água de coco e um mergulho. Quando analisei o estado dos meus pés, me assustei. Bolhas, enormes, vermelhas, assassinas.
Não tinha solução. Impossível voltar, impossível pedir um Amil Resgate, um taxi, um barco, um cavalo, um anjo, qualquer coisa... Absolutamente nada passaria naquele lugar para me salvar. Começou então o trabalho psicológico da luta da mente sobre a dor.
A visão não alcançava nada com cara de ponto de chegada. Olhava para o chão para não me desesperar. Me arrastava. Não conseguia dar dois passos seguidos. Deixava pelo caminho pedaços de pele que se misturavam com a areia. O peito do pé tatuado pelas alças das havaianas. A cabeça dando voltas. Já não enxergava mais as duas andarilhas com pés de ferro.
Eis que surge a luz no fim do túnel, ou melhor, o fim do deserto molhado. Faltava pouco mesmo, mas foi justamente nesse pouco que a bolha estourou. A água salgada fez arder e a dor que eu negava estar sentindo subiu pela perna vencendo a mente nos metros finais. Chorei como uma criança. As paulistas me davam parabéns, que eu era uma vitoriosa, uma guerreira, e me faziam chorar ainda mais.
Foram mais 3 passos para entrar na canoa que fazia a travessia do rio e depois mais uns 15 até chegar em uma pousada que me deu uma banho de água doce e fria, um curativo e uma cachaça. Uma não, duas!
Estava pronta para ir embora. De carro. Essa era, finalmente, uma opção. Mas antes tinha que fotografar esses vilarejo ribeirinho com índios, charretes e pescadores mirim. Rústico ao extremo.
Todo e qualquer sofrimento que passei até esse dia da minha vida, ficou para trás. Nada se compara a transformação que minha mente passou nessas quase 4 horas da maior prova de superação que vivi.
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3 comentários:
caralho! passei mal aqui só de ler.
parabéns meeeeesmo.
Por isso não uso havaianas. Invariavelmente fico com bolhas!
@Isabela, obrigada meeeeeesmo!
@Toni, se não fosse as havaianas eu teria amputado os pés! mas agora só para curtas distâncias mesmo. Lição aprendida!
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